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quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Autárquicas, independentes e neurociência

Hoje, transplantar orgãos é uma acção quase totalmente aceite na sociedade. Desde rins a corações, é uma actividade médica rentável e com divulgada implantação.
Cada um de nós se questionado, normalmente responde que "se necessário, para si ou para um familiar, em princípio aceitaria".
Porém, se existisse a possibilidade de transplante do cérebro a recusa seria quase imediata com um assertivo "não".
Porquê ??

Ainda hoje, o cérebro é considerado algo muito privado apesar de, desde o inicio da civilização, ele ser um orgão muito perseguido para ser alterado para um assertivo "obedeço".
Os métodos utilizados foram variados, desde físicos (tortura, encarceramento, expulsão, electrochoques, etc) até químicos (drogas) passando por relacionais (conversas, psicoterapias, chantagens, etc). O poder sempre gostou de obedientes à sua volta.

Basicamente o objectivo era sempre o mesmo, modificá-lo por processos indirectos. Ou seja, ele estava "protegido" por um castelo inviolável (o crâneo) que não permitia acesso directo e quando permitia era no sentido de "tirar algo" e não de "pôr qualquer alteração pré definida". 
Mesmo a lobotomia de Egas Moniz não dava "um querer", mas apenas dava hipóteses de "não-querer" (abúlico). No dizer de alguns críticos da época, depois da lobotomia, tudo continuava na mesma mas a posição era diferente: "- Je m'en fiche", ou em português vernáculo: "Estou-me nas tintas".

PS - A frase apaixonada "Amo-te do coração", considerando que ele é transplantável, devia passar a ser "Amo-te do cérebro" (até agora não transplantável).


A actual questão da Assembleia da República de passar a ter "independentes" é um problema tão  antigo como a civilização, pois é o "velho" aforisma de "és livre desde que faças o que te mando".
Na prática, a pertença política exige um "transplante de cérebro".

Por outro lado a necessidade de "independentes" significa que actualmente há falta deles, ou seja, há excesso de "dependentes".


Todavia, estes dois conceitos têm significados distintos mas relacionáveis.

A - dependentes-independentes na origem: acesso por via partidária ou por via extra-partidária;
B - dependentes-independentes no funcionamento: ou seja, com ou sem "transplante" cerebral. Por outras palavras, terem (ou não) sofrido as técnicas de controlo cerebral usadas desde o inicio da civilização e terem (ou não) sido modificados para "sou livre desde que faça o que me mandam".

Considerando as actuais regras institucionais dos partidos, o "obedece" é obrigatório. Se esta transformação tem "bugs" e ele não-obedece isso é grave, mas apenas sofrerá algumas represálias de re-educação. Porém se des-obedece isso é grave e mortal. Neste caso, a expulsão é a consequência, mas  em Democracias "duras" poderá ir até à prisão, tortura ou morte.

Porém, não nos deixemos enganar, alterar a origem não altera este segundo aspecto.

Pelo facto de ser "extra-partidária" (independente) na origem não significa que depois fique independente no funcionamento. 
A questão que se coloca é: - Agora que é independente, estará independente ou a "obedecer" a quem ?

Nesta solução, como diz o ditado popular: - "Não se pode tratar a dor na perna pondo remédio nas calças!!!"… ou seja, não vai funcionar.

O centro do problema está nas decisões individuais tomadas na Assembleia (qualquer que seja a origem), portanto, a solução passa por uma avaliação da responsabilidade das decisões que deve ser agudizada em "tempo real" e não esquecidas ou só feita nas "calendas gregas".

Regressando ao "controlo de cérebros", até agora as suas tentativas têm sido feitas por processos indirectos, porém com a neurociência abre-se um novo campo de actuação.

Segundo a Google, numa análise baseada no aparecimento do conceito "neurociência" no massmedia, só a partir de 1970 é que existe um desenvolvimento significativo da sua notoriedade:


Isto significa que, para além de controlo cerebral indirecto pelos métodos tradicionais, um possível controlo directo pela neurociência começa a aparecer e a invadir as áreas da teoria cientifica.
Não só governos, militares e políticos em geral se mostram interessados, como já invadiu áreas colaterais, como por exemplo o neuromarketing, com o chamado "sell-to-cell".

A conclusão é que é urgente para a sociedade resolver o problema da independência do funcionamento da sua gestão, não perdendo tempo com soluções placebo. É preciso procurar soluções vindas do futuro e não ficar preso a modelos de dependência vindos do passado, antes que seja tarde.

Se olharmos para a aceleração da curva de desenvolvimento da neurociência é óbvio que o problema irá afectar não só os nossos filhos e netos, mas também a nossa própria geração.

Há diferença entre "teoria científica" e "hipótese científica", a segunda é preliminar em relação à primeira. As teorias científicas são estruturas bem estabelecidas, suportadas por experimentos e verificações diversas. As hipóteses científicas são explicações com algum suporte, mas ainda sem o nível de consolidação de uma teoria.

Muitas vezes os massmédia divulgam hipóteses científicas com o rótulo de teorias cientificas. No caso da neurociência com a sua complexidade, esta confusão é mais vulgar do que se desejaria, inclusive com a sua introdução em temáticas fílmicas sem o devido cuidado.

Com o desenvolvimento acelerativo existente, à  medida que as pesquisas sobre neurociência aumentam a complexidade também aumenta. As novas hipóteses descobertas em vez de consolidar o que existe, abrem novas possibilidades e enfraquecem as existentes, ou seja, cada vez mais a complexidade é maior…"o que se aprende num ano, nega o aprendido nos anos anteriores."(parafraseando Kathleen Faylor).

Pensa-se que a neurociência pode mudar as tecnologias e também os dogmas e desejos das pessoas que as usam, já se discute "neurolaw", neuromarketing", "neuroeducation", etc, entrando no campo do controlo das memórias, sonhos, pensamentos e desejos das pessoas.

Para uma sociedade gerir a sua Democracia têm que sair do primitivismo dos modelos da "Idade Média" com a sua Inquisição física e psicológica, e "agarrar" as amplas possibilidades abertas pelos finais do século XX, com a neurociência e a quântica.

As tecnologias e seus suportes teóricos são instrumentos, eles dependem do modo como se usam. Se a medicina aumentou os níveis de saúde possível nas sociedades também nos trouxe os "Drs. Mengele" com seus aspectos negativos. Isto não invalida a medicina, invalida os Drs. Mengele. Não se pode confundir instrumentos e pessoas.

Criar independência no funcionamentos da Assembleia da República não é uma opção, é uma exigência…JÁ!!

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