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sexta-feira, 20 de março de 2015

A liderança desafiante

A vida nasce imatura e "amadurece" cá fora,
chama-se crescer e desenvolver.


Nalgumas espécies o "amadurecimento" é curto e rápido,
noutras é longo e lento.
Na espécie humana a imaturidade existe até morrer,
chama-se ter novas ideias, aprender e mudar.

Na prática, tudo isto:

nasceu nas (e das) imaturas novas ideias de muitos.

A civilização existe quando vivemos com as ideias de outros acrescentando complexidade. Não há limites, as suas possibilidades são infindas e as soluções são sempre um aglomerado de muitas ideias que provocam micro soluções, cujo conjunto é a SOLUÇÃO:


Este processo de ter muitas micro-soluções integradas e adaptadas ao problema obriga a haver muitos "micro" inventores a colaborar entre si, num sistema de interdependência. A situação que possibilita e potencia esse resultado constitui o "Scenius" ou "Genius Colectivo" tornado necessário pela complexidade de hoje, bem longe do auto-suficiente e eremita lider-inventor solitário, dono e criador de soluções.

O principio base é que todos temos "relâmpagos de génio" e a civilização é o que permite integrar rentavelmente esses "relâmpagos" individuais numa "luz colectiva".

Na verdade, a diferença entre Leonard da Vinci e Vietti-Teppa é uma questão de Scenius, isto é, no tempo de Leonardo da Vinci ainda não existia o resto dos inventores necessários para complementar a complexidade, por exemplo, a nível do material necessário:


O equipamento usado por Vietti-Teppa (Suiça) pesava 12 kg, mas uma tentativa feita no ano 2.000 por Adrian Nicholas (UK) pesava 85 kg, podemos imaginar quanto pesaria em 1843. O Scenius da época ainda estava demasiado imaturo para a ideia ser concretizável, faltavam "inspirações" de invenções de outros inventores.

Hoje, na complexidade actual, Liderar não é "Zombiar", isto é, estabelecer uma visão e impulsionar outros a segui-la, alternativa que poderá funcionar quando o problema-solução é conhecido e com baixa complexidade na sua aplicação.
Porém quando isso não acontece, isto é, quando não há solução prévia, quando é preciso criar uma alternativa nova, o óbvio de estabelecer a solução e "vender" a sua execução não é nada óbvio.
A execução vai exigir condições novas, "inspirações" de criatividade para micro-soluções que obrigam a reformular, alterar e talvez recusar a solução inicial.

A questão não é de impulsionar a cumprir a solução, mas de inspirar a comunidade a colocar em comum as suas "inspirações" pessoais de génio, colaborar e não conflituar na sua integração de modo a fazer nascer a nova alternativa. É um processo de Scenius e não de Génius.

Numa analogia teatral, não é uma questão de protagonismo no palco do "actor principal", mas sim de se criar nos bastidores as condições para todos quererem, poderem e terem boas representações no palco.

O exemplo mais flagrante desta realidade é a Pixar, sendo Ed Catmull o fazedor destes bastidores e todos os outros 250/300 participantes da comunidade serem os "actores principais".
A função de Ed Catmull como responsável é contornar e evitar tensões, positivar conflitos e unir diferentes opções, clarificar testes, consequências, riscos e vantagens de propostas, maturar as decisões parciais num todo coerente, etc.
Em síntese, Ed Catmull é o "ministro" da CDD" (Colaboração, Descoberta de aprendizagens, Decisão consensual) ou, por outras palavras, é o "ministro" das "Inter-acções positivas entre as diferenças", cujo funciograma de re-adaptação constante para construção de um filme é o seguinte:


Na verdade a civilização é um pêndulo que oscila entre:


Antigamente o normal era "fazer o que sempre se fez" e a excepção era "fazer o que nunca se fez AQUI". Quer isto dizer quer as reais novidades tinham sempre nascido em locais "controlados" por maturidades diferentes (ex., China e Europa), aí experimentados e depois importados por quem tinha disso uma VISÃO prévia. Esse era o lider, a visão era sua e motivava os outros a seguirem-na.
Problemas e crises eram resolvidos pelos lideres de visão, ou seja, pelos que viam as soluções.

Hoje, a complexidade é grande e não há locais isolados, por outro lado a situação inverteu-se, o normal é "fazer o que nunca se fez aqui ou noutro lado" e a excepção é "fazer o que sempre se fez". Verifica-se uma mudança constante, rápida e intensa e os problemas resultam, exactamente, de tudo ser diferente e se fazer o que sempre se fez.
As soluções ditas "normais" deixaram de fazer parte das soluções e passaram a fazer parte do problema, pois não só não resolvem como o aumentam. A História tem muitos exemplos deste "quid pro quo", por exemplo, na situação actual a austeridade faz parte da solução à crise ou parte do problema da crise? E se faz parte do problema da crise ela é solução para quem e para que problema.

Viver  é passear no contínuo do que "que já se fez" até ao "que ainda não se fez" nunca permitindo que acabem os sonhos, ou seja, o mundo do ... "que ainda não se fez" e onde se vai ser imaturo.


[Ver também 
"Innovate the Pixar Way: Business Lessons from the World's Most Creative Corporate Playground", Bill Capodagli, Lynn Jackson.
Pinçamentos: "LabThink - locais de pensar para sair de crises" clickar.
Pinçamentos: "LabThink: aprender a estudar para jovens" clickar.]


terça-feira, 17 de março de 2015

Estudar é natural (vrs Mar2015)





Estamos programados para "estudar".
Estudar é ensinar a si próprio, é fazer auto-ensino.

Auto-ensino é procurar o significado do que quer compreender, é procurar a resposta à simples pergunta “O que é que isto me diz”. 
É a actividade mental de procurar relações, diferenças e igualdades com tudo aquilo que para si já tem significado. 
Ensinar a estudar é ensinar a rentabilizar a construção de significados, aquilo que vulgarmente se chama compreender. 

Quando este auto-ensino é complementado com metodologias deturpadas que não facilitam e bloqueiam esta rede de significados tudo se resume a memorizar e aplicar padrões. O funcionamento “natural” perde-se e ficam processos de aprendizagem com “bugs”. É como começar a andar ou respirar defeituosamente pois [... estudar é tão natural como andar e respirar] são mecanismos naturais base da sobrevivência.

Como um vírus, essas deturpações são depois utilizadas na aprendizagem e estudar torna-se difícil, senão impossível, e desiste-se. Como solução ensina-se mais e estuda-se mais e os "bugs" reforçam-se pois não é um problema de quantidade mas sim de qualidade. Cada vez é mais difícil o aprender e aprende-se menos. O círculo vicioso está instalado.


Estudar é um processo automático que se faz sem se ter consciência do que se faz…é tão "instintivo" como andar.

Por exemplo, "qual é a diferença entre andar e correr?"

A resposta imediata é que correr é mais rápido que andar e os pés movem-se mais depressa. Não é verdade, pode-se andar mais rápido do que correr e com pés mais ligeiros. 
Se não se sabe a diferença como se explica verbalmente à criança a mudança de andar para correr?
Não se explica… mostra-se … ela que veja e aprenda.

"Qual é a diferença entre estudar e não-estudar ?"


A resposta imediata é que a diferença está em "se estuda sabe" e "se não estuda não sabe", mas não é verdade, saber ou não saber, não são diferenças são consequências
Assim, como explicar à criança a diferença entre estudar e não-estudar? Não se explica, nem se mostra porque não há nada para mostrar… pois nada não se vê.


Ver o Einstein a estudar não se vê nada, excepto talvez um sossegado olhar vago e distraído. Estudar acontece dentro da cabeça, no cérebro, ...ninguém vê. 

Em consequência, opta-se por explicar com "aquilo" que se vê, por exemplo, tirar apontamentos e fazer resumos.
Mas tirar apontamentos e fazer resumos é escrever o significativo, ou seja, é sempre o resultado de ter estudado, são consequências de ter pensado (estudado) o que possibilitou "extrair o sumo" (skimming), fazer relações, descobrir conexões, identificar igualdades e diferenças. Numa palavra, adquirir conhecimento.

Se este processo não acontece, esses apontamentos e esses resumos são um trabalho de copista, são "lixo mental" no caminho do conhecimento. Servem apenas para decorar e ser papagaio e eventualmente fazer show de sabedor nos cafés e nos exames:

...sabem muito e percebem pouco...
Estudar não é apenas escrever.  Uma sessão de estudo não é uma sessão de escrevinhar. Na verdade, nos conventos dIdade Média os copistas não eram estudiosos do conhecimento e actualmente, nos tribunais e assembleias, os anotadores e fazedores de actas não são estudiososo dos seus conteúdos.

Estudar não é apenas escrever. Uma sessão de estudo não é uma sessão de escrevinhar. Na verdade, nos conventos da Idade Média os copistas não eram estudiosos do conhecimento e, mesmo actualmente nos tribunais e nas assembleias, os anotadores e fazedores de actas não são estudiosos dos seus conteúdos. 

Escrever, se bem que importante, não é a actividade fundamental do Estudo. Na pré-História, em tribos primitivas e na sociedade actual, problemas são estudados e encontradas soluções sem qualquer utilização da escrita.      
...estudando sem papel nem lápis...
Os escritos dos inventores são apenas registos do resultado de terem estudado e esses registos podem funcionar, automática e simultaneamente, como nova matéria de estudo. Mas, [...estudar e registar não são a mesma face da moeda pois uma actividade não é a outra].

Se ao dar uma flor a uma criança ela depois conseguir explicar essa "flor" é porque conseguiu estudá-la sem precisar de papel nem lápis, nem apontamento e resumos. É óbvio que em situações complexas o método utilizado pode ser rentabilizado com papel e lápis mas eles são apenas facilitadores e rentabilizadores não são a essência do processo.

Como é que os pais ensinam os filhos a andar ?

Não ensinam, apoiam, põem a criança em pé e esperam que ele se "desenrasque", aprenda por si, descubra e ensine a si próprio.
Mais tarde, se o automatismo do andar ou do correr tem bugs, podem não perceber o que acontece e julgar que tudo está bem. Só quando, talvez na escola com a Educação Física, a acção precisa de eficácia é que o problema surge.
Com o estudar sucede o mesmo. Possivelmente, eles também já não sabem estudar mas só na escola é exigida essa eficácia e por isso, então, transforma-se em problema. 

Todos sabemos correr mas é vulgar ensinar a correr bem, todos sabemos pensar mas é invulgar ensinar a pensar bem.

Como é que os pais ensinam uma criança a brincar ? 

Não ensinam, dão brinquedos e esperam que ele se "desenrasque", invente brincadeiras, histórias, lógicas, mundos alternativos e, com a programação automática que tem, experimente, pense, conclua, reformule e aprenda a usar o brinquedo, isto é, brinque.

Quando não aprende, os pais ensinam, mostram como se brinca, visualizam-lhe a brincadeira, ele imita (abençoados os neurónios espelho) e aprende.

Com maior ou menor dificuldade todos o fazem pois estas programações de andar e estudar são instrumentos essenciais da sobrevivência ao permitir repetir sucessos e não-repetir insucessos pois ambos são aprendizagens importantes. Na perspectiva evolutiva não há erros, há apenas êxitos de "como não fazer".

Na escola não aprendem. Porquê ???

Porque o seu estudar já tem bugs. Tal como ao "andar mal" há hábitos motores disfuncionais sem disso ter consciência, também no não-aprender pode haver padrões disfuncionais aprendidos não conscientes e não saber que existem, quais são, porquê e como os corrigir. 

Alguns jovens (10,11 anos) chegam a choramingar: - "Os meus pais zangam-se comigo, querem que eu estude, mas eu não sei como fazer, não consigo…eu leio e não aprendo". 

Felizmente, esta aprendizagem negativa não afecta outras áreas. Eles continuam a saber estudar jogos de computador, como jogar futebol, como enganar o autoritarismo, como fazer o que querem, etc. 
A inteligência não desapareceu, ela tem é um "bug", um vírus que afecta a área especifica daquele tipo de aprender - o escolar - e, às vezes, também contamina outras áreas. 

Por experiência pessoal com um grupo de jovens dos 11 aos 14 anos e com dificuldades escolares tentava que aprendessem a tabuada pelo processo aleatório (e não de cantilenas). Um cigano tentava, cheio de boa vontade, mas sem resultados. 
Em conversa perguntei-lhe por quanto vendia, quando na feira com a mãe, entregava 4 ténis por 8 euros cada? Resposta imediata "Quero 32 euros!

Fiquei estupefacto porque realmente ele vivia um total e angustiado bloqueio anti-tabuada. Depois de várias tentativas nos dias seguintes concluí que o contexto "euros e vendas" ativava e operacionalizava os processos mentais de cálculo. Para a sobrevivência na vida de feira era fundamental dominar a tabuada, porém na escola tudo era bloqueado não conscientemente e com angústias. 

A principal dificuldade do estudar está no pensar, sem isto operacionalizado tudo o resto pode complicar em vez de facilitar.
Aprender sem pensar são apenas automatismos anti-conhecimento [...sabe mas não percebe]. Pode fingir bem mas mais tarde ou mais cedo tudo vai desmoronar.

Por exemplo, ao decorar a tabuada cantarolando sequência de números aprende-se a cantar mas não a utilizar a codificação necessária. Quando quiser multiplicar 8x7 não se começa a cantarolar 8x1=8, 8x2=16, etc. até chegar a 8x7=56. 
Estes processos de memorização para efeitos colaterais são bem salientados por Aldous Huxley com Tommy no seu livro “Admirável mundo novo”, pag 38, Ed. Livros Brasil, Lisboa, com o exemplo do “rio Nilo”.

É o mesmo que ensinar nadar em seco em cima de um banco, esquecendo que aprender significa captar sinaistorná-los significativosintegrá-los e criar novas redes neurais.

Ensinar a nadar não é ensinar a mexer braços e pernas num banco é ensinar a locomover-se rentavelmente no meio aquático, portanto, sem água não existe nadar. Do mesmo modo, ensinar a tabuada não é ensinar a cantar mas sim ensinar a pensar com números.

PS – Os bebés nadam sem técnicas de bruços, crawl, etc, pois nadar é fundamentalmente flutuabilidade e coordenação água-ar (respirar) e sem água isso não se treinaDepois a locomoção pode ser desde o “gatinhar” (nadar à cão) até aos bruços, crawl, mariposa, costas, etc.


O bebé assim que nasce, a sua primeira actividade é APRENDER... aprender a respirar ao ar livre… e essa aprendizagem vai ser utilizada até morrer.
Daí em diante, até aos 3 anos, tem a curva mais intensa e acelerada de aprendizagem da sua vida, desde controlar o corpo, braços e pernas, andar, falar, dominar um idioma, usar objectos, identificar rostos, vozes, animais e pessoas até conseguir, com apaixonada curiosidade, aprender tudo que o rodeia.

Isto é possível porque estudar é muito simples, é receber sinais, conectá-los com os existentes, torná-los significativos, e tudo isso é feito em cada segundo que vivemos.
A palavra-chave desta ideia é "torná-los significativos", quando isto é bloqueado todo o aprender desaparece.

Quando um sinal se "cola" a outros como uma consequência reflexa e colateral a significância não acontece (vide o Tommy do Aldoue Huxley), a compreensão é nula e o aprender não existe. É domesticação e não aprendizagem e isso é mau.

O pior acontece quando esta forma de aprender se instala como única e fica como um novo padrão automático. Por analogia é como alguém que tem o marchar como forma única de andar e depois não consegue dançar na discoteca. Por semelhança, os efeitos negativos do aprender defeituoso só se tornam preocupantes quando afectam áreas de aprendizagem obrigatória, por exemplo, na escola.

A importância da significância

Como exemplo, um coferencista fala do uso de RSS na internet, nos computadores e nos telemóveis. Um ouvinte pergunta o que é isso e ele responde de forma objectiva, sucinta e directa:

- "O RSS é um formato padronizado em linguagem XML originado a partir do DDF e segue as definições W3C".


A resposta é correcta mas só em poucas mentes conseguirá "colar" a ideias já existentes, pelo que escorregará para o "balde do lixo". F
elizmente será anulada e quem fala perderá um ouvinte e talvez outros que não perguntaram. A significância obtida foi zero, a compreensão foi nula mas a memória pode decorar e repetir corretamente.
Se o ouvinte decorar e ficar domesticado, responderá sem erros num exame, o professor dirá que estudou bem e todos ficarão contentes porque o aluno respondeu como aprendeu mas não compreendeu nada e não sabe o que quer dizer. 
Explicar não é dar respostas às dúvidas, é dar informação que possibilite significância e compreensão, que faça "empowerment" (aumento da capacitação-autonomia-fortalecimento) na clarificação da dúvida.


Isto só acontece se informação entrada tem possibilidade de se "agarrar" a alguma já existente e criar uma "porta de entrada" que [...permita, atraia, transforme e incorpore...] a nova informação que se vai apresentar. 
A energia e o imã destas conexões são a significância pessoal que adquire para quem aprende.

Na actual pedagogia surge a corrente do ensino "WIIFM?" que significa "What's IIFor Me?", ou seja, em português vernáculo "o que é que eu tenho a ver com isso?" como sendo a principal e primeira pergunta que está na cabeça de qualquer aluno e a que o ensinante tem que responder em primeiro lugar e a ela voltar várias vezes.
Resumindo, só se pode explicar a partir da mente do outro, pelo que a primeira etapa é pesquisar "o que ele sabe" e começar por aí. Portanto o factor-crítico-de-sucesso se para poder explicar não é aquilo que se sabe sobre o assunto, mas sim aquilo que se sabe sobre aquilo que o outro sabe sobre o assunto.
Regressando ao exemplo do RSS, uma possível resposta para criar as primeiras "pontes informativas" e “ancorar” (Psy francês: ancrage) algum significado susceptível de se colar a outros existentes, poderia ser:


- "O RSS é um processo para permitir e acelerar a troca de conteúdos na Internet e possibilitar actualizações rápidas. É muito usado na divulgação de notícias.

A resposta à pergunta não-consciente de "o que é que eu tenho a ver com isso?" estaria dada, ou seja, "na Internet  com o RSS é tudo mais rápido e actualizado". 
A partir daqui é que a explicação vai começar, orientada pelas dúvidas "como é que faço?", "o que preciso?", "quais os custos/riscos?" e a dúvida crucial "como é que funciona?". 
No planeamento da explicação ou conferência seriam as respostas a estas "questões previsionais" que orientariam a definição do que dizer.


Vulgarmente em vez de se motivar pela criação de significâncias, motiva-se por pressão de valores morais ou por chantagem afectiva ou ainda por ameaças físicas de desgraças no presente ou no futuro. 
Estas técnicas de "motivação colateral” (querer aqueloutro) e "motivação às avessas" (querer evitar aquilo) é o contrário da motivação, pois esta é um movimento PRÓ (querer aquilo) enquanto que as "motivações colateral e ás avessas" funcionam como movimento ANTI (querer qualquer outra coisa mas não aquilo).

Crianças habituadas a estas motivações dão a resposta normal de "Tanto me faz!" pois já aprenderam que "querer qualquer coisa" está fora dos seus interesses. Porém o diagnóstico que lhes fazem é que estão "desmotivadas e sem vontade" quando na realidade estão "motivadas e com vontade" de não querer nada daquilo:

[...estudar é procurar o que para mim tem significado por se ter "colado" ao que já sei e
procurar suas significações (positivas, negativas, interrogadas), repetindo até me sentir satisfeito].

Sublinhar um texto não é sublinhar o importante, nem sequer o que disseram que é importante. É sublinhar a nova significância que "faiscou" na mente e fez um "Ah! Ah! Ah".  Ao integrar-se estas "faíscas" constrói-se, instintivamente, o conjunto que lhes dá significado. É assim que a criança naturalmente estuda as diferenças entre cão e gato e não os confunde.
Em resumo:

[... estudar é procurar ver o TODO com base em DETALHES e de ambos ter uma visão conjunta.
É auto-ensinar, é explicar-a-si-próprio.
Explicar é descobrir conexões significativas (positivas, negativas ou interrogadas) entre o novo e significados já existentes, criando uma nova rede de saberes.
Explicar-a-si-próprio é como respirar, quando acaba é para recomeçar pois há sempre conexões novas a fazer.]

domingo, 8 de março de 2015

Motivação 1.0, 2.0 e 3.0 e métodos de liderança


Harry Harlow, Professor de Psicologia na Universidade de Wisconsin, ao estudar o comportamento dos primatas obteve um resultado inesperado numa experiência que realizou quando colocou 8 macacos Rhesus perante o seguinte problem-solving:


ou seja, para encontrar a solução de levantar a tampa "C" era preciso uma sucessão de 3 etapas pela seguinte ordem:

1º - Tirar o espigão "A";
2º - Afastar o gancho "B";
3º - Levantar a rampa "C".

Os investigadores colocaram aparelhos dentro das jaulas para os habituar a eles e depois poderem prepará-los e induzi-los a fazer o teste dentro de uma semana.

Mas, sem qualquer influência exterior, algo estranho aconteceu. 

Quase imediatamente, começaram a manipular o aparelho, concentrados, determinados e alegres. Em pouco tempo encontraram a sequência solucionadora que depois repetiam, chegando alguns a demorar apenas 60 segundos. Ninguém os ensinou a tirar o espigão, afastar o gancho e/ou abrir a tampa e, muito menos, a exacta sequência necessária.

O mais estranho não foi a sua "habilidade" mental, foi a não-existência de impulsor motivacional para o fazer.

Na verdade, os três impulsores básicos biológicos comer, beber e sexo (motivação 1.0, ver Daniel Pink) não estavam presentes e os dois impulsores sociais prémio e castigo (motivação 2.0, ver Daniel Pink) também não.

A questão que se levantou a Harry Harlow era saber qual era o motivador em jogo que impulsionava os macacos, considerando que nenhum dos outros motivadores estava ainda actuando.

Pensando em situações motivacionais, há seitas religiosas que usam a motivação 1.0 (comer, beber, sexo) através de orgias para alcançar Deus, enquanto outras usam a motivação 2.0 (prémio, castigo) acenando com o Céu e o Inferno.

Do mesmo modo na política, há partidos que propõem Poder, Riqueza, Estatuto  usando  a motivação 1.0  possibilitando recursos para "comer, beber, sexo", enquanto outros mais ascetas usam o Prémio-Castigo da motivação 2.0 propondo lutas entre partidos SEM asneiras/subornos (Céu) versus partidos COM asneiras/subornos (Inferno), uns atraindo "chicos espertos" e os outros "missionários moralistas".

Ainda hoje nas empresas (e nas escolas) a dominante é o Prémio-Castigo da motivação 2.0 (salário/prémios versus despedimento) apesar de após Elton Mayo, com a sua teoria das relações humanas, a influência da motivação 1.0 ter sido trazido à ribalta .

Considerando Cristo, Buda e a própria cosmologia hindu (além do trivial não conheço muito do Alcorão e Maomé) parece-me que motivavam e motivam também fora da motivação 1.0 e 2.0 A questão que surge é - " Qual será ela?".

Qualquer que seja a hipótese da motivação 3.0, não me parece que o Workólico  esteja usando as duas primeiras, nem que elas sejam dominantes nas manifestações políticas, apesar de existir uma percentagem de manifestantes que procura viver teias relacionais (motivação 1.0) e/ou catarse céu-inferno por anti-partido versus pro-partido (motivação 2.0).


Regressando aos macacos, na altura Harry Harlow resolveu reforçar a motivação com comida e o resultado foi negativo pois criou rupturas. 
Muitas vezes isto acontece nas empresas com os prémios de desempenho, pois esquece-se que ganhar o 1º prémio pode ser obtido por se tentar ser o melhor e/ou tentar que os outros sejam piores. Numa palavra, "pode ser pior a emenda que o soneto" para se criar motivação, pois só depende do tipo de "inteligência estratégica" usada pelos concorrentes e da "cegueira" dos organizadores.

A conclusão de Harry Harlow foi que era preciso ver com outros olhos a problemática da motivação e "abandonar grande parte do lixo teórico" com que pensamos (close down large sections of our theorical junkyard).

 Autonomia versus automatia

Parece que uma grande diferença entre motivação 2.0 e a possível motivação 3.0 estará em que a primeira exige conformidade (automatismo) e a segunda compromisso (autonomia).

O método do Prémio-Castigo aplicado a um acto vai fazer com que o acto passe a ser secundário e o principal passe a ser o SIM-PRÉMIO (a chamada motivação colateral) ou, se não o prémio, pelo menos o NÃO-CASTIGO (a chamada motivação inversa). 
Viver a vida com motivações pela inversa parece ser um castigo inventado por um Deus maquiavélico, cuja religião são princípios culturais definidos pela negativa.

O compromisso, irmão gémeo da cumplicidade, exige impulsores motivacionais mais "sofisticados" que os biológicos básicos e os sociais básicos, como ficou revelado na experiência dos macacos.

Pensando na actual política em Portugal não me parece que uma nova proposta motivante possa ter como alicerce a habitual motivação 1.0 mobilizadora de "chicos espertos" em procura do básico "Poder Estatuto Dinheiro", nem apoiar-se na motivação 2.0 atraindo "missionários" de combate ao Mal e/ou na procura do Bem.

Passeando fora das estruturas comunicativas "oficiais" vemos que na sua periferia existem vários manifestos de vozes fora de motivação 1.0 e 2.0
A situação actual de uma sociedade quieta não é o "quietismo português" mas, talvez e apenas, o "standby português" na sua expectativa de arranque. Só falta o sinal de partida com uma proposta do tipo motivação 3.0. A motivação já existe, só falta expressá-la, é outra espécie de descoberta de um caminho marítimo que já existe só falta percorrê-lo.