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segunda-feira, 4 de março de 2019

Ensinar entre "zero" e "infinito"

Aprender e respirar são dois actos naturais e, ambos, impossíveis de remover (undo) a não ser pela morte. Entrar na vida obriga a fazê-los pela primeira vez... logo à chegada:


O sorriso feliz significa que, após o parto, teve que aprender a respirar cá fora e teve êxito. Aprender e Respirar foram os dois primeiros actos com sucesso que lhe permitiram continuar vivo.

A espécie humana, encaixada na "ciência antiga", ajuda pela dor (bater) para que isso aconteça, o choro é a explosão neuromuscular facilitadora dessa aprendizagem. 

Esta forma pedagógica de ensino continua pela vida fora na família, escola, trabalho e sociedade. Castigos, gritos, repressão, autoritarismo, etc, são a forma "disfarçada" desse método de ensinar a respirar... "o hábito ficou no sangue cultural" e assim [...um estalo dá sempre geito para educar].

Paradoxalmente, os animais superiores também ajudam esse aprender a respirar, mas acariciam, lambem e não mordem... têm uma cultura diferente. 

Ensinar e aprender não são sinónimos. O professor ensina e o aluno aprende. A escola não é um local de ensinar, é um local de aprender. 

Ensinar é enviar ao aluno um estímulo provocador de novo significado. Se não há novo significado não há aprender, há apenas carregar novos dados na memória, o aluno fica um simples estivador que transporta dados.

O estimulo usado para ensinar podem ser palavras, gritos, actos, gestos, objectos, ruídos, consequências, etc.
A sua origem pode ser um emissor intencional, chamado professor, ou um emissor ocasional ou ainda um emissor neutro (natureza, animais, etc). Todo o estimulo que provoca significado é um ensinante, se este tem intenções com objectivos prévios do significado a ser criado chama-se professor. 

Para criar os significados (chama-se ensinar) o professor de Matemática tem objectivos diferentes dos do professor de Música. E eles recebem dinheiro para o fazer... simplesmente, eles não fazem os significados no aluno, eles só os propõem,  é o aluno que os produz na sua mente. 

O professor que faz ensino (emite estímulos) e não provoca aprendizagem (não surgem significados) falha a ensinança.
Pode acontecer que um ensino "infinito" dê aprendizagem "zero".
Pode acontecer que um ensino "zero" dê aprendizagem "infinita"

Newton é um exemplo clássico de ensino zero com grande aprender (emissor neutro).  Na verdade a árvore ao deixar cair a maçã na cabeça de Newton ela não é um professor, todavia ele tem um choque significativo, o "Ah!Ah!" da pedagogia experiencial, pensa e descobre a gravidade:


Não houve ensino apenas uma estimulação neutra que criou um significado intenso (aprendizagem). Pode acontecer que um ensino emitindo muitas palavras/imagens/actos (estimulação) sobre a gravidade origine significados zero (não aprendizagem).

Criar significados é um conceito com vários modelos mas há um que me agrada é [...criar um script intensamente conectado com scripts existentes, alterando a rede de relações]. 
Script = roteiro, rotina, padrão, protocolo

Um seu sintoma é que surgem transformações nos scripts já existentes que, normalmente, se expressam em perguntas, reacções automáticas, conclusões inesperadas, etc.
Quando o ensino proíbe perguntas, manifestações e conclusões aos seus aprendentes está a mutilar o processo de aprender.

Num ensino que instala scripts e destrói a sua conexão com os scripts existentes (magister dixit) é um processo de domesticação chamado "obediência", por exemplo quem sabe mas não aprendeu diz [... é assim,  não sei o que é, nem porquê, nem para quê]. A pessoa transformou-se num objecto, num armazenador de scripts isolados.

Um método de potenciar criação de significados é dinamizar a relação entre o detalhe e o geral e vice versa.

Uma história contada  

Uma criança de 3 anos entretido a brincar em casa de um familiar é interrompido pelos pais para ir à casa de banho. Não muito satisfeito, levanta-se e dizem-lhe onde é. 
Aproxima-se, a porta tem uma pequena abertura, ele empurra e nada acontece, puxa e nada acontece. Torna a repetir e a porta não abre, repete e fica parado a olhar para a porta sem a abrir.
O pai levanta-se e mostra-lhe que para abrir a porta ela desliza para a esquerda e entra na parede. Fica sério e experimenta umas duas vezes, entra na casa banho. Depois, sai e puxando as calças para cima diz para o pai: "Esta casa é muito estranha".

Fiquei a pensar em tudo isto, um pouco espantado. Para ele, a porta deslizar esconder-se na parede teve o mesmo efeito que a maçã ao cair na cabeça do Newton, pois ambos detonaram significados que "incomodaram" os scripts existentes. O estimulo (neutro ou intencional) teve uma "ajuda" pedagógica para se relacionar com scripts existentes (puxar e empurrar portas). 

O ensinante é um facilitador da integração de scripts e facilitador da criação no outro pelo outro do Ah! Ah! da compreensão e a aprendizagem nasce... esta é a função do Pedagogo.

Viver é ser "incomodado" pelos significados à sua volta. Em linguagem comum chama-se APRENDER.
A Pedagogia é uma dança a três: ensinar, aprender e significados.