Mudar de crença é como arrancar a pele psicológica que nos protege.
Quando este "arrancar" é feito em cirurgia psicanalítica isso é tão doloroso que se chega a soluçar e, normalmente, o paciente conversa deitado e o "cirurgião" não veste bermudas, nem usa chinelos, a formalidade é essencial. É uma situação em que "não se brinca" (gun no fun).
Vi ontem um filme do género "merece muito ser visto", em que se apresenta uma viagem pelo mundo dos conhecimentos e crenças e como é doloroso pensá-las sem ser a partir delas […justificando-se por si próprias], muitas vezes com incapacidade em fugir à estratégia do "...é...porque É...", técnica cientificamente chamada "fé".
O filme chama-se "O homem da Terra", de Richard Schenkman, 2007,
sendo quase um filme de teatro, pois tudo se passa dentro de uma sala com um diálogo entre 8 professores, mas onde o suspense e a tensão dramática duram até ao fim.
Quando tudo acaba com um final lógico, um pequeno pormenor inesperado faz voltar ao início e o ilógico do desconhecido lógico toma conta da situação.
O tema são crenças e conhecimentos que se possuem, mas são despoletados com uma situação ilógica pensada e discutida por lógicas de diferentes cientistas (Historiador, Antropólogo, Arqueólogo, Biólogo, Religioso, Artista, Psiquiatra, Psicólogo) em que os conhecimentos se entrelaçam com posições pessoais de vida de crenças assumidas.
As crenças pode ser pensadas como scripts pessoais alimentados por padrões culturais, condicionados e condicionantes na relação corpo-consciência.
Analisando "sabedorias antigas"ainda em vigor, podem ser encontradas muitas "situações ilógicas" à luz da sabedoria ocidental activa hoje, todavia lógicas dentro dessas sabedorias antigas.
Wade Davis, antropólogo e etnobotânico tem pesquisado muitas culturas antigas ainda existentes, desde o aborígine australiano com o seu Dreamtime até a habitantes sobreviventes em florestas distantes.
O livro "The wayfinders, Why ancient wisdom matters in the modern world" é uma colectânea de casos em vários sítios, que põem questões de relações "sensitivas" diferentes com o mundo, com diferentes operatividades na relação com ele devido a [...outros scripts individuais (??)].
O seu outro livro, que originou um filme, 1988, "The serpent and the rainbow" fala sobre a droga e magia negra no Haiti, entrelaçadas no "jogo" de scripts.
Uma crença é um script semelhante à dor, só a sentimos quando a temos. Ver a dor nos outros pode originar uma compreensão empática, emocional, intelectual, mas quando alguém está com dores nós não tomamos aspirina.
Pode porém acontecer que, ao ver um filme de grande intensidade dolorosa, a nossa dor interior seja tão grande que ultrapasse uma eventual dor corporal semelhante.
Será que existe aqui um script sensitivo (um 6º sentido) muitas vezes chamado "mimético" que todos temos e que, no quotidiano, pode estar mais ou menos intensificado, reduzido ou deturpado (sado-nasoquismo??)?
Nas técnicas de "healer shamanico" esta capacidade é citada como devendo estar apurada […como os animais que sabem quando o outro está morrendo e se afastam].
PS - Há alguns anos um veterinário contou-me que independente do tratamento que fazia, quando um cão estava muito mal levava-o para casa e pelo comportamento dos seus próprios cães previa o que iria acontecer… se recuperava ou não.
Mas nas crenças do "healer shamanico" é possível adquirir esse "sentido"de sentir a dor dos outros mediante treino de rituais, todavia salientam que depois pode ser dolorosos andar no exterior vendo as "dores de todos os dias" ou, numa linguagem actual, ser-lhe-ia impossível ser militar ou torturador profissional.
O racismo pode ser visto com um script-crença perante o qual temos posições mas na prática é como a dor, só se sente quando a temos.
Por experiência pessoal, há alguns anos atrás, antes de 1974, muito queimado do sol e estando algures na Europa do Norte, fui impedido de entrar em alguns restaurantes e bares por ser cigano e nem sequer consegui comprar água ou ir ao WC.
Aprendi pela pele o que era o racismo.
Mais tarde li o livro do jornalista John Howard Griffin, "Na pele de um negro" (ed. Europa-América), e também o compreendi na pele.
É uma espécie de diário do que sofreu passeando pelo sul racista dos USA, depois de ter alterado com drogas a sua pele branca para negra, que não retomava a cor branca a não ser com o tempo.
Aconteceu-lhe não poder comprar água ou ir ao WC, tendo que utilizar paredes escondidas e sendo por isso preso por comportamento social indevido.
É interessante ver como ele se transformou sendo actualmente activista de Direitos Civis (Prison of Culture: Beyond Black Like Me, 2011).
Realmente alterar sentidos e crenças altera-nos a nós, ao mundo em que vivemos e à nossa acção nele.
Um outro exemplo interessante é a nossa relação com animais.
Um aspecto que me impressiona num grupo de animais (peixes, aves, cavalos, cães,…) é o seu repentino sincronismo de movimentos em certas situações. Qualquer que seja o método usado a decisão de mover aparece ao mesmo tempo. Terão uma linguagem comum?
Por outro lado, quem tem uma relação próxima com um cão, gato, cavalo, ou outro animal, quase de certeza que algumas vezes sentiu comunicação com ele […até parece que entende tudo…].
Será que temos um script em standby para "conversar" com eles? Se esse script for desenvolvido o nosso mundo vai ser outro. Se culturas primitivas dizem que conseguem falar com animais o que sucederá à civilização actual se este script se tornar vulgarizado nos civilizados? O que acontecerá aos talhos?
Depois de vermos com os nossos filhos os filmes de Walt Disney, o que fazemos se formos com eles a um restaurante e virmos este cartaz:
O que fazem as nossas crenças??? Será que funcionam??
Sabendo isto e depois de ver o filme "O homem da Terra", fiz umas festinhas às minhas crenças instaladas e fui dormir esperando sonhar com o Pai Natal,... os 5 anos é sempre uma idade agradável.
Pensar nos meus pré-conceitos?? Não obrigada, estou bem assim!!…ou talvez não!!
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