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quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Ver e olhar, o treino possível



Vejo com os olhos e 
olho com o cérebro.
Pensar é ver com o olhar.

Quando um antílope vê um reflexo amarelo na folhagem…normalmente transforma-se em almoço do leão, porém se olhar em vez de apenas ver o reflexo de fuga é imediato.

A diferença entre ver e olhar é primordial para a sobrevivência e significa que olhar é  construir um significado para o que se vê.

Mas esta não é a questão fundamental porque fazê-lo é um reflexo automático da nossa programação genética, pois "quando vemos…olhamos sempre", ou seja, há sempre um significado que lhe é ajustado.
A questão é - "Qual é a lucidez deste ajustamento ?".

Quando esta lucidez é feita de "óbvios em stock", isto é, de cassettes papagueadas quer sejam sociais, políticas, religiosas ou mesmo comerciais, ou de "palavras do dono", isto é, papagueando opiniões do "Super Ego exterior" ou "Pai Cultural" (complexos de Édipo ou Electra mal resolvidos??), o olhar existe mas usa óculos escuros com cor prédefinida. Em resumo, esse olhar não é de confiança se não tira os óculos.

Criar esta lucidez no olhar é uma actividade formativa fundamental que as crianças gostam de fazer pois abre-lhes a porta da passagem entre vegetar e viver.

PS - Viver é criar significados ao que se vê, ouve, cheira, faz, sente, prova, pensa.

Uma técnica de treino que está a ser usada é a "leitura" de desenhos e pinturas.

Um exemplo:
(Litografia de Paul Klee)

- "Já viram ???…e então???"

Com uma pergunta propositadamente tão vaga, os circuitos neurais têm dificuldade em encontrar conexões. O "ver" existe mas o "olhar" custa a aparecer fora do óbvio: 

- "É desenho com riscos!"

ou da opinião de críticos: 

- "Aaahh! é Paul klee, então…!"

Mas com perguntas mais orientadas:

- "É homem ou mulher ???"

- "É dia ou noite ???"

- "Está calor ou frio???"


Algumas respostas de significados possíveis começam a aparecer (ver no fim).

O interessante é que o cérebro "olha" e encontra respostas à revelia do cognitivo consciente, agarrando conexões que muitas vezes não se sabe como aparecem.

A resposta é "homem" ou "mulher"? Porquê ? O que sente/pensa para dizer isso ?
É Dia ? ou Noite ? Porquê
Está Calor ? ou Frio ? Porquê ?

A resposta não é importante (não há certo ou errado nesta actividade), ela é apenas o detonador da etapa fundamental: pensar o porquê dessa resposta. É aqui que está o treino, é aqui que estão os mecanismos de construção da lucidez no olhar… "os neurónios têm razões que a razão desconhece."

Se libertos das formatações do "óbvio" e/ou do "Super Ego exterior", as respostas mais frequentes são:

- Ser mulher, pois há sugestão de saia junto aos pés, de ser um vestido no peito e barriga, o chapéu feminino e cabelo comprido;
- Ser dia, pois há a ideia de Sol com raios tangenciais e óculos escuros
- Estar calor, pois há vê-se a paisagem com dificuldade como quando o ar está muito quente. 

E já agora…- "É nova ou velha ????"  Porquê ??

Nas crianças, se habituadas e treinadas no "olhar", a sua autonomia pessoal é uma capacidade em desenvolvimento imparável.

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